Prós
  • Ótimo desempenho de bateria
  • Potência elétrica
  • Android nativo
Contras
  • Design da frente é convencional
  • Dificuldades em ter um elétrico no Brasil
  • Sem integração com celular

Em uma família de gente bem sucedida, que vai e volta do escritório em ternos Armani, o Volvo C40 Recharge é o membro que usa tênis velho, jaqueta de couro (vegano) e camiseta de banda. É o filho rebelde – mas que ainda carrega o DNA e o sobrenome.

A Volvo já foi tida por uma criadora de carros quadrados – figurativa e literalmente, porque foi uma das últimas empresas a abandonar o formato anguloso, já entrando no século 21. Sempre foi famosa pela alta qualidade e alta segurança: foram eles os inventores do cinto de segurança de três pontos, em 1959. Isso num tempo em que montadoras americanas tinham medo de incluir cinto de segurança, achando que clientes iriam rejeitar seus carros se admitissem que podem sofrer acidentes.

Emoção não era o ponto alto da Volvo, enfim. Desde a década de 2000, a montadora sueca vem tentando quebrar o molde do solene carro do meritíssimo juiz, do excelentíssimo prefeito, do senhor patrão. Hoje deseja estar na vanguarda, tomando decisões ousadas como parar de vender carros a combustão interna no Brasil. Ainda assim, verdade seja dita: na sua linha atual, segurança, espaço e luxo são o ponto principal, enquanto emoções intensas ficam mais para a subsidiária esportiva, a Polestar.

Ou ficavam: o C40 não é o carro do meritíssimo excelentíssimo senhor. É um SUV com forte ênfase na letra S, sport, e menos no U, utility. De fato, com sua traseira quase fastback, é mais para crossover que SUV, enquanto seu irmão, o XC40, é um SUV com a cara do resto da linha.

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Volvo C40 Recharge na Hacienda Santa Ines, México
Volvo C40 Recharge na Hacienda Santa Ines, México | Imagem: Pedro Dantas/Divulgação

É impossível não comparar com o XC40: quase tudo o que tem no C40 tem nele. Inclusive o furioso torque elétrico. Ambos tem os mesmos dois motores, um em cada eixo, com tração 4×4, produzindo os mesmos 408 cv e perfazendo os mesmos 0 a 100 km/h em 4,7 segundos. Internamente, a plataforma do C40 é nova, planejada para ser elétrica desde sempre, e dispensando algumas heranças da era da combustão interna, como usando rodas mais fechadas, por não precisar tanto de refrigeração. Mas, na prática, são carros parecidos.

A frente é idêntica – e não é um ponto forte, a meu ver. Parece demais com a dos Volvos a combustão interna, com a grade tapada por uma peça. Elétrico devia é ostentar sua condição, abandonando qualquer sugestão de grade. Toda a ousadia da traseira não condiz com uma frente tão convencional.

Volvo XC40 Recharge Plus

Porque a traseira literalmente é um pequeno espetáculo. Você liga o carro e recebe uma animação pelas lanternas de LED, com um carro mexido. Ainda que o formato geral das lanternas lembre vagamente o dos outros Volvos, elas têm uma forma futurista, bem mais ousada. Os spoilers e o aerofólio, o teto de vidro, o perfil mais baixo, e a curva geral da traseira: tudo isso sugere algo bem mais esportivo que o design do XC40. Ambos tem uma alma esportiva no acelerador, mas o C40 é o deixa claro à primeira vista do que é feito (exceto se visto de frente).

Saudades da Suécia

Por fora é esporte, por dentro, é luxo. É um carro com interior espaçoso de couro e camurça sintéticos, produzidos de plástico reciclado, com uma fórmula secreta da Volvo. A cor azul da camurça (tem outras opções) é chamada Fjord Blue e o painel tem detalhes que lembram geleiras. Coisas que remetem à Suécia natal.

Volvo C40 Recharge
Fábio Aro/Volvo

Uma outra decisão ousada, mas que é compartilhada com outros elétricos da Volvo, é o botão de partida. Ele não existe. Nem tampouco freio de mão. Você simplesmente entra, com a chave eletrônica, põe a marcha – aí há familiar alavanca – e sai. Clicar no botão P já ativa o freio de mão, e escolher D ou R desativa.

Câmbio do Volvo C40 Recharge
Câmbio do Volvo C40 Recharge | Imagem: Fábio Aro/Divulgação

Uma consequência curiosa de não haver botão de partida é que o carro ativa seus sistemas eletrônicos imediatamente ao entrar. Se, saindo do carro, você estava tocando uma música – no vibrante sistema Harman Kardon –, quando volta, a música vai continuar no ponto onde havia parado, sem qualquer ação sua. Ao mesmo tempo desconcertante e simpático: é como se o C40 estivesse retomando um assunto com o dono: “então, como a gente estava dizendo…”.

Se você sair de um estacionamento, ou de ré, vai notar imediatamente a câmera de 360 graus. Sensores em todas as direções recriam o cenário em volta e mostram o carro visto por cima no ambiente. O chão e objetos parados são fieis, mas carros e pessoas aparecem distorcidos, de forma cômica: aparecem como gigantes em torno do carrinho no meio.

É um sistema extremamente eficiente. Você pode tranquilamente manobrar sem nem olhar pelas janelas ou retrovisores. De fato, prefiro assim: tenho que admitir que sou uma negação em baliza. Quando pego um carro novo para testar, sem estar familiarizado com seu tamanho e amplitude de curva (que é apertada para o tamanho no C40), fico com medo ralar na guia e acabo estacionando quase no meio da rua. A câmera 360 me permitiu fazer as balizas mais exatas da minha vida.

Outra parte em tecnologia, essa mais polêmica: a central de mídia não aceita Android Auto ou Apple Car Play. Você pode conectar seu celular por Bluetooth para atender chamadas e ouvir direto de sua saída de som, mas só isso.

O Volvo C40 tem sua própria conexão de internet móvel e vem com Android For Cars – é o sistema operacional do próprio carro. No lugar de usar apps no seu celular, você instala no carro. Coisas como o Spotify e o app colaborativo de encontrar carregadores elétricos Plugshare. Nada de streaming de vídeo: tem o YouTube Music, mas não o YouTube. O motorista assistir vídeos é uma temeridade, mas poderia servir para o passageiro.

Um exemplo de como é diferente isso: o Spotify – você precisa dar login no carro – , diferente da versão de celular via Android Auto, permite pesquisar por músicas. Mas bloqueia tudo quando o carro está em movimento. Isso seria impossível se o sistema não tivesse em contato direto com o veículo, usando informações dele.

Outro exemplo de interação nativa é com o Google Maps. Quando você digita uma localização, ele diz o quanto de bateria o carro terá ao chegar lá, e o quanto terá se for e voltar para a posição atual. É imensamente superior a usar o GPS do celular.

O Google diz que esse é o futuro e que o Android Auto é obsoleto. A Volvo é uma das primeiras a concordar.

Fora da central de mídia, há o painel eletrônico, que mostra o mapa do GPS no centro, se o carro está carregando (com freio regenerativo) ou gastando, mas não mostra uma coisa que muitos vão achar importante: a autonomia da bateria medida em quilômetros. Há apenas a carga, na forma de percentual. Quilômetros só aparecem no fim da carga, numa emergência.

Mas talvez isso mude. Porque esse é um carro que, como um celular, recebe atualizações de seu sistema operacional. Aconteceu comigo, e foi a primeira vez na vida em que vi isso.

O C40 me avisou de atualizações e pediu para eu confirmar. Fui informado que o carro ficaria fechado e inoperante por volta de uma hora e meia. Concordei e… bom, nada. O carro ficou, de fato, fechado e inoperante, sem dar feedback da atualização.

Tentei entrar nele uma hora e dez minutos depois e não tive problema: já tinha instalado tudo. Notei que a interface do painel havia mudado de design um pouco, com barras cortadas aparecendo no indicador de bateria, que era liso, e círculos um pouco menores.

Vencida a ansiedade de distância

E, falando em bateria, essa parte foi um triunfo. Mesmo sem o carro indicar a autonomia, o GPS do Google faz o trabalho. Resolvi uma prova de fogo: uma viagem ao interior de São Paulo, lutando contra a famigerada range anxiety, ansiedade de distância.

O destino era Limeira, que fica a 150 km. Planejei a viagem usando o Google Maps para descobrir onde havia abastecimento rápido, e achei um posto médio na ida, de 30 kW, e um mais rápido na volta, de 45 kW. Nenhum deles seria capaz de preencher a bateria de 78 kW do C40 no tempo em que leva para fazer uma parada e comer um espetinho, mas daria para quebrar um galho e garantir a volta.

Detalhe do carro carregando
Imagem: Divulgação/Volvo

Saindo de São Paulo, a bateria estava em 95%. Chegando no primeiro posto, em Jundiaí, a pouco mais de 60 km de distância, estava em 80%. Deixei a bateria no tempo de um intervalo normal no posto, uns 50 minutos, e ela estava a 92%. Não é ideal, mas a viagem estava garantida.

Chegando em Limeira com 59%, passei só um pouco na cidade e voltei no dia seguinte. Em outro posto, com um carregador mais potente, de 125 kW (na prática, fez com 44 kW), consegui preencher de 56% a 94% no tempo da parada, pouco mais de uma hora. Chegar em São Paulo não seria, estava claro, problema nenhum.

Não me importei em não chegar a 100% de bateria porque preencher totalmente a bateria de um elétrico não é uma boa ideia. Os próprios fabricantes não recomendam, porque pode prejudicar sua bateria. Segundo, o carregamento se torna mais lento quanto mais próxima de cheia a bateria está. Sair desses 94% para 100% poderia levar mais do que o que já havia gasto antes. O carregador começou em 45 kW e havia caído para 7 kW quando eu terminei.

O C40 não tem, como outros elétricos, um modo menos potente, de economia. O computador simplesmente decide como atingir a autonomia máxima, de 420 km. E parece ter sido por volta disso mesmo que ela estava durando nos testes.

Pisando com o Volvo C40

No caso do Volvo C40 recharge, as aparências não enganam. É dirigindo é que ele se revela um bad boy. Se o XC40 se comporta da mesma forma na estrada, o C40 se comporta assim e ainda tem o, vamos dizer, physique du rôle, ele se parece mais com o personagem.

O coice elétrico não é exclusivo dele, mas é muito notável. Coice elétrico – expressão minha, mas podem espalhar – é o seguinte: um carro elétrico acelera de forma diferente de um a combustão interna. O torque, a energia nas rodas, fica disponível imediatamente, sem precisar atingir a rotação ideal no motor. Pense em ligar uma motosserra versus ligar uma furadeira.

Como consequência, mesmo quando um elétrico leva mais tempo que um a combustão interna nos 0 a 100, ele parece ainda assim acelerar mais ferozmente. Porque, nos primeiros décimos de segundo, na hora em que ele começa a se mover e cola você no banco, foi mesmo mais rápido. E não tem o feedback do barulho do motor, o que dá a coisa um quê meio fantasmagórico. Ou de montanha russa.

Volvo C40 Recharge
Fábio Aro/Volvo

O C40 não só dá seus coices, como é meio nervosinho de dirigir regularmente. Não é um descontrole – insegurança é palavrão para a Volvo –, mas cutucar o acelerador faz o C40 parecer ansioso para pular para hyperdrive, feito a Millenium Falcon.

O peso também faz diferença, com uma tendência a embalar na descida e a inércia sentida nas freadas, e também como o carro fica grudado no chão nas curvas. Tem um quê – e digo isso num sentido positivo, de poder – algo de dirigir um trem expresso.

Quanto vale o show?

O preço é, dentro do que se espera de um elétrico de luxo, R$ 419.950. A Volvo é a primeira a dizer que o valor de seus veículos os coloca num espaço de elite: o C40 pode ter uma alma meio assim tipo punk, mas está mais para Supla que para João Gordo (minhas referências musicais podem estar precisando atualização).

Mas um custo alto não significa necessariamente um custo-benefício baixo. Porque as características do carro o colocam em competição com esportivos dedicados, e o bem mais caro Jaguar I-Pace. Em comparação com esses, o Volvo C40 oferece uma experiência sólida e muita diversão, por um preço menor.

Enfim, um carrão esportivo no corpo de um SUV cross médio, e uma ousadia de uma marca com fama de comportada. É um Volvo para quem quer esse selo de qualidade com um tempero mais picante.

Nossa avaliação
Nota Final
9.2
  • Design
    8.0
  • Conforto
    10.0
  • Potência
    9.0
  • Custo-benefício
    9.0
  • Acessórios
    10.0

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