Na última sexta-feira (5), o Olhar Espacial levou ao ar seu programa de número 20, que teve como tema a exploração de Marte, com destaque para a disputa cada vez mais acirrada entre os EUA e a China pelo estabelecimento da presença humana no planeta.

Sob o comando de Rafael Rigues, editor de Ciência e Espaço do Olhar Digital, e do nosso colunista Marcelo Zurita, presidente da Associação Paraibana de Astronomia (APA) e diretor técnico da Rede Brasileira de Observação de Meteoros (Bramon), o Olhar Espacial é transmitido ao vivo, todas as sextas-feiras, às 21h, pelos nossos canais oficiais no YouTube, Facebook, Instagram, Twitter, LinkedIn e TikTok, e conta sempre com a participação dos espectadores, enviando suas perguntas, sugestões e críticas.

Rafael Rigues e Marcelo Zurita, apresentadores do programa Olhar Espacial. Imagem: Captura de tela YouTube

“Marte é um planeta que intriga a humanidade desde que começamos a olhar para o céu”, disse Rigues, na abertura do programa. “O nome Marte é uma homenagem ao deus romano da guerra, mas o planeta já era conhecido pelos babilônios 2 mil anos antes de Cristo. Desde que nós começamos a explorar o espaço, nós temos essa ideia de, um dia, poder morar em outros planetas. E o planeta mais próximo para isso é Marte”.

Rigues lembrou que o momento que estamos vivendo atualmente é bastante similar ao que acontecia na década de 1960, quando havia uma disputa entre a União Soviética e os EUA para saber quem chegaria primeiro à Lua. “Só que, desta vez, o grande prêmio é Marte,e os participantes são os EUA e a China”.

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Por que colonizar Marte?

De acordo com Zurita, cada astrônomo, estudioso e cientista do assunto tem uma resposta para essa pergunta. “Muita gente fala em colonizar Marte por ser um próximo destino para a humanidade, por ser uma opção à Terra – já que nós estamos destruindo o nosso planeta. Mas, uma das coisas que mais chama a atenção quando se fala em Marte remete àquela eterna busca por vida fora da Terra. E tudo indica que Marte já teve condições ideais para manutenção da vida”.

Ele destaca que uma das principais dessas condições seria a presença de água líquida, mais especificamente na área conhecida como cratera Jezero, região de estudo do rover Perseverance.

“Essa cratera, provavelmente, já foi um grande lago de água. E o local de pouso do Perseverance foi escolhido justamente pelo fato de essa cratera já, provavelmente, ter sido inundada por água”, explica Zurita.

Na 20ª edição do programa Olhar Espacial, que vai ao ar todas as sextas-feiras, às 21h, pelo canal do Olhar Digital no YouTube e em todas as nossas redes sociais, os apresentadores debateram a exploração do planeta Marte. Imagem: Captura de tela YouTube

Rigues citou outro importante motivo para a colonização de Marte: garantir a sobrevivência da raça humana. “Existe uma piada que diz que se os dinossauros estivessem em um programa espacial, talvez eles ainda estivessem por aqui. Colonizando outros planetas do nosso sistema solar, ou quem sabe luas – ou até daqui a milhares de anos, outros sistemas estelares – nós garantimos a sobrevivência da nossa espécie a longo prazo”.

Uma terceira razão levantada por Zurita foi de o planeta Marte poder servir como base para explorações futuras. “Lançar um foguete da Terra é algo complicado, principalmente em razão da gravidade, que é relativamente alta. Isso começa a ganhar outra perspectiva quando falamos, por exemplo, em bases na Lua, onde temos uma gravidade bem menor do que aqui. Marte, por sua vez, teria uma gravidade intermediária. Mas, o interessante é que a partir desse planeta, poderia ser produzido o combustível necessário para essas viagens”.

Conforme o Olhar Digital noticiou no fim do mês passado, um estudo liderado por Mikhail Shubov, professor adjunto e pesquisador do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Massachusetts, trata exatamente desse ponto: a utilização de Marte como fonte de hidrogênio, que certamente será um dos elementos mais valiosos da economia espacial.

Momento atual da exploração do Planeta Vermelho

Depois de discutidas as possíveis razões pelas quais Marte desperta tanto interesse para pesquisa, os apresentadores abordaram qual é a situação atual da exploração do planeta.

Segundo Rigues, os EUA têm, no momento, quatro equipamentos em solo marciano: o rover Curiosity (que está em Marte há 9 anos), o rover Perseverance (que chegou no planeta em fevereiro de 2021), uma sonda fixa chamada InSight (que, presa ao solo, estuda o interior de Marte – e fenômenos como os martemotos) e o helicóptero Ingenuity (que foi enviado junto com o Perseverance e faz imagens da superfície, identificando potenciais perigos no caminho do rover ou áreas de interesse para exploração).

Em relação à China, em março deste ano, o país pousou no Planeta Vermelho o rover Zhurong. “A China já havia mandado dois rovers para a Lua, o Chang’e 3 e o Chang’e 4, além de ter enviado uma sonda para colher amostras lunares e trazer para a Terra, o Chang’e 5”, disse Rigues. “E, com o Zhurong, ela se torna o terceiro país a conseguir essa façanha de levar um rover a Marte, sendo que o primeiro deles foi a União Soviética, em 1971”.

Segundo Rigues, a missão soviética, no entanto, teve um sucesso “parcial”, tendo em vista que sua espaçonave chegou a pousar em Marte, mas parou de transmitir imagens apenas 20 segundos depois. “A União Soviética tentou outras cinco vezes depois disso, e não conseguiu pousar um rover em Marte nenhuma vez. A Rússia também fez uma tentativa, junto com a União Europeia, e não obteve sucesso. E, surpreendentemente, a China conseguiu o feito logo na primeira tentativa, o que é um grande atestado de competência do país no setor aeroespacial”.

O programa discutiu os motivos de se explorar Marte, as vantagens de uma colonização do Planeta Vermelho, como estão os estudos na atualidade, o que se esperar para os próximos anos e quais os países que têm mais chances de ser o primeiro a levar os humanos até lá. Imagem: Captura de tela YouTube

Rigues citou que os Emirados Árabes Unidos enviaram o satélite orbital Hope para estudar Marte. “Ele não pousou em Marte, mas está na órbita no planeta, e já enviou vários resultados científicos interessantes sobre a composição da atmosfera marciana”.

Ele também ressaltou que, para 2022, é esperado o envio da missão ExoMars, da Agência Espacial Europeia (ESA) em parceria com a agência russa Roscosmos, que levará o rover Rosalind Franklin.

E a presença humana em Marte?

Um dos pontos altos do programa foi quando os apresentadores trataram da presença humana no Planeta Vermelho. 

Segundo Zurita, esse é um projeto lotado de desafios. “O principal problema é que a distância entre a Terra e Marte é muito grande e varia bastante no decorrer de um ano em função das órbitas dos dois planetas. No momento de maior aproximação, essa viagem levaria aproximadamente seis meses”, explica. “E, depois desse período, a configuração desses dois planetas já estaria bem diferente, então, para o retorno, seria necessário aguardar mais de um ano para a janela de retorno. Ou seja, com a tecnologia que nós temos, seria uma viagem de, no mínimo, dois anos”.

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Isso exigiria um suporte muito grande de comida e outros recursos para garantir a sobrevivência e a sanidade da tripulação a bordo da missão. “Esse é um dos grandes desafios, e, para isso, muitos projetos e estudos estão em andamento para desenvolver novas formas de alimentação e outras necessidades da exploração humana em Marte”.

Rigues destacou que outro grande obstáculo para se chegar vivo a Marte é enfrentar a radiação cósmica. “Ainda não sabemos que efeitos a radiação cósmica geraria no corpo humano, mas podemos esperar desde a mutação de DNA, até câncer e tantos outros tipos de problemas de saúde”. Os apresentadores destacaram que também existem alguns projetos em estudo para enfrentar o problema.

Missões análogas a Marte também foram abordadas no programa. Zurita explicou o que são essas atividades de visitas simuladas ao planeta. “Existem estações que simulam o ambiente marciano. Nos EUA, tem a Mars Desert Research Station (MDRS). E nós temos também, aqui no Brasil, no Rio Grande do Norte, uma estação onde, neste momento, está ocorrendo uma missão ‘tripulada’, que é a Habitat Marte”.

Segundo Zurita, esses lugares proporcionam atividades e treinamentos que reproduzem as condições do planeta. 

“Essas atividades envolvem a simulação de isolamento, das condições de trabalho em laboratório, da mobilidade, de locomoção com o traje, de comunicação, entre outras”, exemplificou Rigues.

EUA x China: quem chega primeiro?

Para Zurita, a humanidade não chegará em Marte ainda nesta década. “Acho muito provável, no entanto, que na década de 2030, já tenhamos os primeiros humanos pisando em solo marciano”. 

Sobre qual país será o primeiro a obter essa conquista, ele acredita que é algo que ainda se tem muito a discutir. “Há cerca de três anos, não teríamos dúvidas em responder que os EUA teriam esse pioneirismo. Só que, hoje, nós temos a China, que logo numa primeira tentativa conseguiu pousar um rover em Marte com sucesso. Então, vemos que eles estão investindo muito em tecnologia aeroespacial e têm grandes chances de ganhar essa disputa. Inclusive, a China, no momento, é a que parece estar com mais poder de ação”.

Rigues aposta suas fichas nos EUA. “Mas, não vai ser a Nasa”, acredita. “Para mim, vai ser a iniciativa privada. Faltam para a Nasa dois recursos cruciais: vontade política e dinheiro. O governo norte-americano prefere investir em programas de defesa e armamento do que na exploração do espaço. Então, as empresas privadas, especialmente a SpaceX, têm mais chances de chegar lá. E eu creio que isso acontece em 2040. Primeiro, por causa do Programa Artemis, da Nasa, de retorno das missões tripuladas à Lua, no qual a Nasa e a SpaceX estão envolvidas. Depois que esse objetivo for alcançado é que elas vão começar a pensar em Marte”. 

Considerando a questão dos dois anos que duraria o percurso de uma viagem a Marte, todos os procedimentos que antecederiam a missão definitiva, além de eventuais atrasos, que são possíveis, Rigues afirma que não vê isso se concretizar antes de 2040.

Confira a íntegra da 20ª edição e as todas anteriores na playlist do Olhar Espacial no YouTube do Olhar Digital!