Quem acompanha as notícias sobre as missões tripuladas ao espaço aqui no Olhar Digital certamente já se deparou com três termos que são usados de forma quase intercambiável: astronauta, cosmonauta e, mais raramente, taikonauta. Todos eles se referem à mesma coisa: um tripulante que tem um papel ativo em uma missão espacial. Mas se são equivalentes, por que há três palavras diferentes para a mesma coisa?
De certa forma, a resposta é simples: orgulho nacional. Cada país com um programa espacial tripulado tem um termo próprio para diferenciar seus viajantes do espaço, e suas conquistas, daqueles a serviço de outros países.
O primeiro homem no espaço, o soviético Yuri Gagarin, que viajou a bordo da Vostok 1 em 12 de abril de 1961, foi um Cosmonauta. Originalmente usado pelo programa espacial soviético, e depois adotado pela agência espacial russa (Roscosmos), o termo é uma “anglicisação” da palavra russa “kosmonavt” (космонавт em cirílico) e teria sido cunhado por Mikhail Tikhonravov, engenheiro aeroespacial soviético que foi um dos pioneiros da área.
Tikhonravov sugeriu o termo como uma alternativa a “Astronaut” (Astronauta), que já era usado em inglês pelo menos desde a década de 1930. Este termo, por sua vez, parece ser derivado do francês “Aéronaut” (o nosso “aeronauta”), que designava os “viajantes dos ares”, como os pioneiros do balonismo, desde 1784.
![Rosto de Yuri Gagarin projetado na fachada de um prédio em Moscou](https://img.odcdn.com.br/wp-content/uploads/2021/04/gagarin_shutterstock_1076730308.jpg)
Na prática o primeiro astronauta foi o norte-americano Alan Shepard, que voou a bordo da cápsula Freedom 7 em 5 de maio de 1961, menos de um mês após o voo histórico de Gagarin. Como estávamos no auge da guerra-fria, o uso dos termos acabou refletindo a divisão geopolítica da época: países alinhados à União Soviética usavam “Cosmonauta”, e os aliados dos EUA usavam “Astronauta”, ou equivalentes em seus idiomas locais.
Já termo chinês, Taikonauta, se popularizou com a primeira missão tripulada do programa espacial do país, a Shenzhou 5, lançada em 15 de outubro de 2003. A bordo estava Yang Liwei, piloto militar e major-general do Exército de Libertação Popular (PLA, People’s Liberation Army).
Na China os astronautas são chamados de “hángtiān yuán” (航天员), algo como “pessoa que navega os céus”, mas “taikonauta” é o termo equivalente em inglês usado pela agência de notícias do governo chinês, a Xinhua, desde o início do programa espacial do país. Sua origem é incerta, mas segundo a Wikipedia há referências de seu uso em grupos de discussão na internet desde ao menos 1998.
![](https://img.odcdn.com.br/wp-content/uploads/2021/09/abertura-Shenzhou-12-2.jpg)
Um outro termo surgiu neste ano, cortesia da agência espacial europeia (ESA): parastronauta, ou seja, um astronauta que tem alguma deficiência física. Ao anunciar o processo de seleção para seu grupo de astronautas de 2022, a ESA passou a aceitar candidatos com deficiência dos membros inferiores (seja congênita ou resultado de amputação), diferença no comprimento das pernas ou baixa estatura (menos de 1,30 metros), que normalmente seriam excluídas.
Mas a primeira parastronauta, na prática, foi a norte-americana Hayley Arceneaux, que participou da missão orbital privada “Inspiration4“, realizada pela SpaceX em setembro de 2021.
Representando a “esperança” e enfermeira do Hospital Pediátrico St. Jude Children’s Research Hospital, no estado norte-americano do Tennessee, Arceneaux foi paciente do hospital, onde tratou um câncer ósseo aos 10 anos. Durante o tratamento, foi submetida a uma cirurgia que instalou um joelho artificial e substituiu parte do fêmur da perna esquerda por uma prótese de titânio, o que acabou deixando uma perna um pouco mais curta que a outra.
![Hayley Arceneaux, tripulante da Inspiration 4](https://img.odcdn.com.br/wp-content/uploads/2021/02/Hayley_Arceneaux-1024x576.jpg)
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Quem decide quem é um astronauta?
Definir quem é ou não um astronauta parece fácil: astronauta é quem já viajou ao espaço. Certo? Bem, as coisas não são tão simples assim. Em primeiro lugar, é necessário definir onde começa o espaço. E a resposta é: depende de para quem você pergunta.
Segundo a Federação Aeronáutica Internacional (FAI), organização sediada em Lausanne, na Suíça, a fronteira do espaço é a “Linha Kármann”, uma linha imaginária a 100 km de altitude acima do nível do mar. Ela foi batizada em homenagem a Theodore von Kármán, engenheiro e físico húngaro-americano que tentou definir este limite em 1957.
Mas nos EUA, o limite é definido de forma diferente. Segundo as forças armadas do país, o espaço começa a 80 km acima do nível do mar, aproximadamente na fronteira entre duas camadas da atmosfera chamadas mesosfera e termosfera.
Ou seja, segundo os EUA o bilionário Richard Branson, que chegou a 86 km de altitude a bordo da espaçonave VSS Unity em julho deste ano, foi ao espaço. Mas segundo a FAI, não.
![Richard Branson](https://img.odcdn.com.br/wp-content/uploads/2021/07/Richard-Branson-2.jpg)
Mas não é só a altitude que define quem é ou não um astronauta. O papel desempenhado pelo viajante na missão, seus objetivos, a serviço de quem a missão foi realizada e até mesmo quem confere as “asas de astronauta” também são fatores determinantes.
O critério mais simples é: um astronauta é uma pessoa que voou em um veículo a uma altitude superior a 80 Km a serviço da Nasa ou das forças militares dos EUA. Um exemplo é o já citado Alan Shepard, ou qualquer outro astronauta de carreira a serviço da Nasa.
Outra definição foi estabelecida pela Administração Federal de Aviação (FAA), entidade que controla o setor aeroespacial nos EUA. Para ela, um “astronauta comercial” é alguém que voou a 80 km ou mais como tripulante em um veículo não operado pela Nasa e demonstrou atividades essenciais para segurança pública, ou que contribuíram para a segurança de voos espaciais tripulados. Nesta categoria se enquadram Mike Melvill e Michael Massuci, pilotos da Virgin Galactic.
Uma terceira definição é a de “astronauta privado”, que seria quem voa à Estação Espacial Internacional (ISS) como parte de um “voo espacial com financiamento privado em um veículo comercial dedicado à missão” para “conduzir atividades comerciais ou de marketing pré-aprovadas na estação espacial”. No momento, ninguém ainda recebeu este título.
![](https://img.odcdn.com.br/wp-content/uploads/2021/10/asas-de-astronauta-Inspiration4.webp)
Já um indivíduo que voa à ISS em um veículo numa missão coordenada pela NASA ou pela Roscosmos é um “participante de voo espacial”. Exemplos seriam o bilionário japonês Yusaku Maezawa ou mesmo nosso Ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes.
Por fim, há os turistas espaciais. O termo não-oficial se aplica a qualquer passageiro pagante em uma espaçonave privada não operada pela NASA ou por forças militares que voe a uma altitude superior a 80 km.
Aqui se enquadrariam os bilionários Richard Branson e Jeff Bezos, o ator William Shatner e os tripulantes da missão Inspiration4 da SpaceX, mesmo que estes tenham recebido asas “não oficiais” emitidas pela empresa.
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