Construída e mantida por um consórcio de 15 países, a Estação Espacial Internacional (ISS) é uma maravilha da engenharia e um exemplo concreto do que nossa espécie pode conseguir quando escolhemos a cooperação. Continuamente ocupada há mais de 20 anos, ela é um laboratório orbital onde pesquisas sobre os mais variados temas, da biologia à engenharia de materiais, são conduzidas em benefício da humanidade.

De todos os membros do consórcio, EUA e Rússia certamente são os mais importantes. É comum dizer que a ISS tem um “lado russo” e um “lado americano” (embora a realidade seja um pouco mais complexa), e cidadãos dos dois países são presença constante nas tripulações que se revezam em órbita a cada seis meses.

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Infelizmente, a harmonia no espaço não se reflete aqui na Terra. Com o início das hostilidades da Rússia contra a Ucrânia nesta quinta-feira (24), os EUA e seus aliados na Europa ameaçam os russos com “sanções nunca antes vistas”, criadas para afetar sua economia e limitar sua capacidade de acesso à tecnologia desenvolvida no ocidente.

Estação Espacial Internacional, em um dos incríveis registros feitos pela tripulação da missão Crew-2 durante seu retorno à Terra
Estação Espacial Internacional, em um dos incríveis registros feitos pela tripulação da missão Crew-2 durante seu retorno à Terra
Imagem: NASA

E com isso, surge a questão: como fica a operação da ISS neste momento? Poderiam os russos retaliar e retirar sua tripulação e cessar o envio de suprimentos? E se isso for feito, o que poderia acontecer com a estação?

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A própria construção da ISS garante a cooperação entre seus membros. O “lado russo” depende de painéis solares no “lado americano” para obter energia elétrica, e estes dependem dos russos para, basicamente, manter a estação “no lugar”.

Isso porque mesmo a mais de 400 km da superfície ainda há atrito entre a estrutura e nossa atmosfera, o que faz com que sua velocidade e altitude sejam constantemente reduzidas. Por isso, periodicamente são necessárias manobras para compensar essa “queda”, feitas usando os propulsores das espaçonaves russas que periodicamente visitam a estação.

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Emblema oficial da ISS destaca os 15 países que participam do programa. Imagem: Nasa
Emblema oficial da ISS destaca os 15 países que participam do programa. Imagem: Nasa

Ou seja, se um lado tomar uma ação para prejudicar o outro, também prejudicará a si mesmo. Fora isso, ambos os lados têm sistemas de suporte de vida que, apesar de independentes, se complementam. O reabastecimento da estação com suprimentos, equipamento científico e combustível é dividido entre os EUA, com as espaçonaves Cygnus e Cargo Dragon, e a Rússia, com os cargueiros Progress.

Em declaração à Associated Press, Scott Pace, ex-secretário executivo do conselho espacial do ex-presidente Donald Trump e agora diretor do Instituto de Política Espacial da Universidade George Washington, disse que a estação espacial “é amplamente isolada” de eventos políticos.

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“É possível imaginar uma ruptura com a Rússia que colocaria em risco a estação espacial, mas isso estaria no nível de derrubar as relações diplomáticas”, disse Pace. “Isso seria algo que seria um último recurso, então eu realmente não vejo isso acontecendo a menos que haja um confronto militar mais amplo.”

O cosmonauta russo Maksim Suraev posa ao lado de dois trajes espaciais Orlan, usados durante caminhadas espaciais, no módulo russo Zvezda
O cosmonauta russo Maksim Suraev posa ao lado de dois trajes espaciais Orlan, usados durante caminhadas espaciais, no módulo russo Zvezda
Imagem: Nasa

Já Jeff Manber, presidente da empresa norte-americana Voyager Space, disse em declaração à United Press International (UPI) que eventuais efeitos do conflito serão sentidos a longo prazo. “O ponto crítico será 2024, quando a Rússia decidirá se continua uma parceira e se queremos que ela continue como parceira”. 

Em junho de 2021 o presidente da agência espacial Russa (Roscosmos), Dimitry Rogozin, ameaçou deixar o programa da Estação Espacial Internacional em 2025, caso os Estados Unidos não levantem as sanções contra o setor espacial do país. “Se as sanções permanecerem e não forem suspensas em um futuro próximo, a questão da retirada da Rússia da ISS será responsabilidade dos parceiros americanos”, disse.

Além disso, Rogozin declarou que a Rússia tem a intenção de construir sua própria estação espacial, e estuda o envio de cosmonautas à estação chinesa, Tiangong, que ainda está em construção. Os países também anunciaram uma cooperação para a construção de uma base de pesquisa na Lua. Vale lembrar que a China é atualmente a principal adversária dos EUA, tanto aqui na Terra quanto no espaço.

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Mas isso ainda é, por enquanto, uma preocupação para o futuro. Questionada sobre o impacto do conflito nas operações atuais da ISS, a Nasa afirmou ao Olhar Digital que “tudo ocorre como de costume”.

“A NASA continua trabalhando com a Corporação Espacial Estatal Roscosmos (Roscosmos) e nossos outros parceiros internacionais no Canadá, Europa e Japão para manter operações seguras e contínuas da Estação Espacial Internacional. A NASA e seus parceiros internacionais mantêm uma presença humana contínua e produtiva a bordo da Estação Espacial Internacional há mais de 21 anos”, disse Joshua A. Finch, relações públicas da agência.

Segundo ele, a Rússia lançará três cosmonautas rumo à Estação Espacial em 18 de Março. No dia 30, uma espaçonave Soyuz retornará com os cosmonautas Pyotr Dubrov e Anton Shkaplerov, além do norte-americano Mark Vande Hei, que está completando uma missão de quase um ano a bordo.

Por fim, dois astronautas norte-americanos completaram neste mês seu treinamento na Rússia, e três cosmonautas russos estão no Centro Espacial Johnson, em Houston, nos EUA, também em treinamento para missões futuras.

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